Lunar (Moon), Duncan Jones, 2009




Longa-metragem de estreia do diretor Duncan Jones, filho de David Bowie, mostra que é possível fazer muito com tão pouco. É ambientado num futuro relativamente distante, onde a energia da terra provém da exploração do Helium 3 das camadas rochosas da lua. Nesse contexto, somos apresentados à Sam Bell (Sam Rockwell), o cientista encarregado de operar a estação espacial que realiza tal tarefa. Ele é apenas um cara com uma missão a cumprir. Com seu contrato prestes a terminar, Sam só pensa em voltar para casa e encontrar com a sua família. Seu único companheiro é o computador Gertie (voz de Kevin Spacey) que expressa suas “emoções” através de simples smiles projetados em sua tela.

O filme se desenrola a partir desse diálogo homem x máquina tecendo um curioso paralelo com o clássico “2001 Uma Odisséia no Espaço” e como não deveria deixar de ser Sam Rockwell carrega o filme todo nas costas, atuando praticamente sozinho.

O roteiro de Nathan Parker baseado num argumento de Jones, é original, não busca soluções fáceis e sabe lidar com questões existenciais e outros temas delicados como solidão e individualidade sem cair na pieguice ou em velhos clichês do gênero. Além de ser embasado em questões extremamente atuais e flertar com temas já amplamente conhecidos.

Outros pontos dignos de nota são a bela fotografia de Gary Shaw que confere um visual correto por meio de lentes grandes angulares, e a direção de arte que acerta em mostrar a estação espacial como um lugar asséptico, e nem um tanto acolhedor. Além de também remeter ao já citado “2001” e “Solaris” com seus sets minimalistas.

É claro que nem tudo são flores. Devido ao orçamento quase irrisório para os padrões atuais, 5 milhões de dólares, os efeitos visuais nem sempre funcionam como deveriam e algumas tomadas exteriores (boa parte do filme se passa dentro da estação espacial) simplesmente não convencem. Mas o saldo final é positivo.
Extremamente despretensioso, Lunar veio para mostrar que a ficção científica não está perdida. Conseguindo dar uma lufada de ar fresco num gênero tão desgastado ultimamente. Pena que não teve a devida atenção por essas bandas.

(Anderson Correia)

Viver (Ikiru), Akira Kurosawa, 1952




Viver (Ikiru) é um filme que pode ser dividido em duas partes.

Na primeira, o personagem principal já começa morto. Não, não enterrado dentro de um caixão mas ele está morto. Depois de trabalhar por 30 anos no mesmo lugar, só tratando de burocracias, ou seja, só carimbando papéis, Watanabe não tem mais nenhuma perspectiva de vida e a única coisa que ele sabe fazer de verdade é o tedioso trabalho de carimbar papéis. Até que ele descobre um câncer que vai mudar tudo.

Otimamente filmado e trabalhado o filme de Kurosawa é capaz de emocionar qualquer “urso-pardo” que apareça para vê-lo. As atuações são um caso a parte e o do ator principal se destaca imensamente. Num papel onde a personalidade do personagem muda drasticamente ele consegue captar exatamente as mudanças do personagem.

A saga de Watanabe não é só pelo tempo perdido em anos de trabalho. É a procura de uma identidade, uma personalidade que, se alguma vez ela tenha sequer existido, foi perdida. As andanças pela cidade procurando alguém que lhe mostrasse o caminho evidenciam bem como o personagem está perdido internamente.
Watanabe não sabe quem ele é ou o que ele é. “A Múmia”. Um ser morto que espera voltar a vida. Que espera ser alguém novamente.

As divergências e brigas com o filho também mostram que ele virou uma “marionete”, um boneco sem vontade própria que deixa ser manipulado. Quando ele começa a sua jornada, ele rompe os fios que o seguram mas não os jogam fora. Ele nunca aprendeu a fazer sozinho e precisa que outros o “controlem” para aprender o que é a vida.

A segunda parte mostra o que ele conseguiu através de sua procura.

Essa parte é magistral. Filmada praticamente em um só ambiente, todo o resto da história de Watanabe é contada através de diálogos, em que ele não participa por motivos maiores. O porquê de sua mudança de personalidade é questionada constantemente, como se não fosse possível para um homem a mudança. Claro que eles não sabiam que Watanabe já sabia seu futuro e por isso mudou.

Viver mistura o passado (Lembranças), presente (Mudanças) e futuro (Certezas) pelas ruas de um bairro japonês onde algo está prestes a mudar por causa de um homem e sua procura para achar Ele mesmo.

(Gabriel Cardoso)

O Espelho (Zerkalo), Andrei Tarkovsky, 1975




Este filme soviético de 75, que alterna-se no espaço entre a pré-guerra, a guerra e o pós guerra de 1960, apresenta o mundo (em seus vários sentidos) percebido por Alexei.

Não é falho chamar a película de autobiográfica pelo protagonista compartilhar com o diretor memórias tais como as de guerra em Moscovo e a perda dos pais, no entanto há mais de Tarkovski, Alexei e de nós naquilo que percebemos sem nos ser contado. Vemos correr Macha, mãe de Alexei; vemos correr o vento por espaços abertos ainda que interiores; vemos correr o tempo do filme em uma direção e depois viramos em outra como se vasculhássemos entre fotos de superfície laminada que nos refletem.

Ao alternar entre esses três espaços temporais principais mais como se dobrando-os do que cortando-os (no sentido técnico de corte) e entre sonhos (tidos quando?); ao alternar entre cores; ao alternar entre a face da mãe de Alexei, da mãe de seu filho e da Jovem com um Ramo de Zimbro (retrato feito por Leonardo da Vinci) nos é dito dentre várias coisas: "de que outra forma sentimos o tempo se não como passado, presente e futuro impregnados uns nos outros no eterno agora?".

(Ludmila A. R.)

Querida, Vou Comprar Cigarros E Já Volto, Mariano Cóhn e Gastón Duprat, 2011




Este filme argentino se desenvolve em torno de Ernesto, homem rancoroso e frustrado que é abordado por um estranho imortal e poderoso, e este lhe faz uma proposta: reviver 10 anos de sua vida, e em troca, Ernesto receberá 1 milhão de dólares. Apesar de muitos acertos técnicos e opções estéticas interessantes, trata-se de uma produção de qualidade mediana, tendo sua maior força no enredo descontraído com momentos muy contundentes.

O longa tem presença constante de narração em off, mas esta não cumpre apenas a função de explicar o enredo. O próprio Alberto Laiseca, autor do conto que originou o longa, comenta a história e interage com ela, funcionando em conjunto com os personagens, e também xingando-os sempre que possível. Além dele, há o voice over que representa os pensamentos de Ernesto, que conforme suas desventuras se desenrolam, se tornam mais conturbados e pesarosos que no início. Por fim, até mesmo o Imortal compartilha seus pensamentos com o espectador em dados momentos.

Nenhum dos personagens do longa desperta simpatia, exceto pelo excêntrico autor-narrador. São todos seres bastante naturais, humanos, e Laiseca abusou disso fazendo-os desprezíveis, todos. Após alguns minutos acompanhando o olhar ranzinza de Ernesto, o espectador é induzido a compartilhar de seus preconceitos e desamores, e é difícil conter o ímpeto de xingar todas as pessoas que vêm e que vão. Laiseca revela um pouco de si mesmo a cada nova aparição, e sua visão do mundo, da passagem do tempo e das pessoas constitui o núcleo significativo do longa.

“Este é um mundo mágico, e não se pode imaginar o que não existe”, diz Alberto Laiseca. Estes dizeres podem não fazer sentido sozinhos, podem não ter tanto impacto no enredo, mas é notável o impacto que têm na estética adotada na produção, e no tratamento que o par de diretores dá ao roteiro. É o primeiro acerto do filme, não dar atenção, justificativa ou explicação aos elementos sobrenaturais. Eles estão presentes, e isso é tudo o que importa. Sem arriscar-se em efeitos especiais desnecessários, a montagem do filme lhe confere uma unidade ausente em muitas superproduções, e o pouco caso que se faz dos elementos fantásticos é quase cômico. Há inclusive um cuidado reconfortante em escapar dos efeitos sonoros usuais para reforçar a sobrenaturalidade do que exibem os planos, e toda a produção tem um ar de descontração, leveza, pureza e até mesmo originalidade.

A trilha sonora do filme foi bem construída e utilizada decentemente, pois mesmo com as ocasionais repetições, a música não cansa o espectador. A edição de som eficiente consegue atrelar os efeitos sonoros, os voice overs e a música como se fossem uma coisa só.

Com o passar do tempo, Laiseca ganha cada vez mais importância para o enredo, e sua história se confunde e se mescla com a de seu personagem, de modo que o autor e sua personalidade jocosa e desbocada tornam-se mais interessantes que o destino de Ernesto, este descrito pelo Imortal como um homem “medíocre, mesquinho e egoísta”, capaz de causar mais dano que os mais temíveis déspotas da História.

(Rodrigo S. Pereira)

Cineclube B. D. (Apresentação e Programação)

APRESENTAÇÃO
Olá, caro visitante!
Para quem não nos conhece, criamos este cineclube em setembro de 2011, quando éramos alunos do primeiro período de Cinema e Audiovisual no Centro de Artes e Comunicação da UFPE. Até o fim do período letivo, realizamos 8 sessões, sendo a primeira e última excepcionais em número de visitantes, além da presença de palestrante na primeira, e exibição exclusiva de curtas produzidos por outros alunos do curso na última. Nós criamos o cineclube na intenção de abrir um espaço para a discussão de filmes diversos, sem limitar-nos à pura e simples crítica destas produções, mas a fim de expandir nosso repertório cinematográfico e refletir, exercer e exercitar os conceitos acadêmicos que vínhamos aprendendo. É importante pontuar que o cineclube é aberto para todos, e é de suma importância que tenhamos, além de nosso olhar, a visão do público não-acadêmico.

DAS SESSÕES
Nos reunimos no CAC no fim das tardes de sexta-feira. Excetuando casos particulares (feriados, recessos acadêmicos, problemas técnicos, etc), as sessões são semanais.

DO BLOG
Neste blog divulgaremos, antes de cada exibição, nossas críticas dos filmes selecionados. Após cada sessão, também divulgaremos uma reflexão acerca do tema. Além destas publicações periódicas, publicaremos sempre que possível outras reflexões a respeito do Cinema e tudo que o envolve.

DO TÍTULO
Perdemos muito tempo e quebramos nossas cabeças em busca de um nome para o cineclube, um nome que fizesse sentido, no mínimo. O que nos ocorreu, entretanto, é que mais importante que o nome do cineclube, seria o que faríamos dele, ou seja, nossa identidade cineclubista. Portanto, adotamos a sigla B. D., que por um tempo despertou a curiosidade de colegas. Nossa logomarca, enfim, entrega o jogo, e até mesmo a piada interna que gerou a sigla está presente nela.